Era um sábado chuvoso e nublado. Muito nublado !
Desde o café da manhã no Hotel Garrafão em Boituva-SP, sede do Centro Nacional de Paraquedismo, o Max, paraquedista do Rio de Janeiro vinha tentando convencer o Faxa de Curitiba de que daria prá saltar.
Passaram a manhã inteira na área de saltos esperando que a chuva parasse e como isso não aconteceu voltaram para o hotel para almoçar e o combinado era ficar por lá, dormir se fosse o caso e só retornar
à área
se o tempo abrisse.
Enquanto voltavam para a área de saltos o Max dizia que o piloto era experiente e que conhecia a região como poucos e que até já tinha visto pequenos buracos azuis naquele céu totalmente branco.
Muita insistência depois, por volta das 14 horas e convencidos pelo Max, embarcaram no PP-DQX, o famoso Cessna 190 do comandante Ulisses Berggren, o Faxa, o Jorginho do RJ, o Bacco de SP e o Fideles de Boituva que iria gravar em vídeo o salto de treinamento da equipe .
Logo que o avião atingiu uns 3 mil pés de altura ficou tudo branco. Não se via praticamente nada !
O Faxa começou a reclamar para o Max : Eu não disse ?! Eu não disse ?!
Talvez para acalmar o pessoal o Ulisses falava que iria voar em círculos e que não haveria problemas.
Também disse que iria sintonizar uma rádio da cidade e que por meio dos sinais dessa rádio os lançaria sobre a área de saltos.
A confiança na experiência do piloto era muito grande e o pessoal ficou concentrado então no treinamento
e não no ponto de saída mas dava prá ver que o Ulisses estava perdidinho da silva.
Em dado momento o motor do DQX teve a potência reduzida com convicção pelo piloto e lá se foram os cinco, voando dentro de uma imensa e espessa nuvem branca.
O salto foi todo dentro dessa paisagem e só na altura de comando da abertura dos pára-quedas é que tiveram a visão do solo.
Todos conheciam muito bem aquela região. Afinal, saltavam lá assiduamente durante anos e anos ...
Mas a verdade foi que ninguém reconheceu onde estavam e só viam um imenso canavial repleto de pequenos caminhos em seu interior. O Max, antes de pousar, gritou : É o Vietnan ! É o Vietnan !
Não se tinha a menor idéia de que rumo seguir mas pelo menos estavam todos juntos e sãos.
Escolheram uma das várias opções de caminhos e seguiram por ele até chegarem a um rio que depois ficaram sabendo ser o poluído Rio Sorocaba.
Enquanto resolviam o que fazer, o Faxa não parava de pegar no pé do Max dizendo que não queria fazer aquele salto, que sabia que não ia dar certo, etc, etc.
O Fideles ria o tempo todo e dizia : Gente, daqui a 20 anos nós ainda vamos lembrar e rir um bocado desse dia !
O rio era relativamente largo e ficou resolvido então que o Jorginho e o Bacco iriam atravessá-lo nadando para procurar ajuda.
Podia-se ver na margem oposta um barquinho de madeira ancorado e a idéia era pegar esse barco e descer o rio em busca de socorro.
Foi cômico ver os dois pelados e com uma trouxa de roupas amarrada na cabeça para que não molhassem. Pareciam duas baianas típicas, nadando pelo rio e equilibrando as trouxas.
Ao chegarem ao barco descobriram que o mesmo estava preso por grossas correntes de ferro e cadeados.
Tiveram então que ir à pé e começaram uma longa caminhada. Andaram durante muito tempo até chegarem a uma fazenda e ouvindo latidos de cachorros se armaram com galhos de árvores e se dirigiram a uma pequena casa.
Ao contarem que tinham saltado de paraquedas e que precisavam resgatar seus amigos, ninguém acreditou e foram postos para correr dali.
Caminharam bastante até chegar ao Corpo de Bombeiros de uma cidade das vizinhanças onde conseguiram finalmente contar o que tinha acontecido.
Minutos após a partida do Jorginho e do Bacco começou a chover forte, muito forte !
A vegetação do local era rasteira não oferecendo nenhuma proteção ao mundo de água que caia.
O grupo que tinha ficado na beira do rio improvisou então uma cobertura usando um dos velames de um dos paraquedas, o que funcionou por pouco tempo pois logo o tecido ficou totalmente encharcado.
O Faxa estava louco prá fumar mas só tinha os cigarros e nada de fósforos. E continuava a pegar no pé do Max culpando-o por aquela situação. E o Fideles ria o tempo todo...
Escureceu e esfriou. A situação ficou muito incômoda pois além das roupas molhadas não se enxergava nada dentro daquele imenso canavial com seu labirinto de estreitas passagens.
Horas depois o tempo deu uma melhorada e podia-se ver ao longe, muito longe, pequeninas luzes da cidade de Boituva. E o Faxa dizia ao Max : Olha lá, algumas daquelas luzes devem ser do Hotel Garrafão ! Se eu não tivesse topado fazer esse salto, estaria agora debaixo das cobertas, quentinho e assistindo televisão !
Ao que o Max sempre respondia que não poderia saber que aquela situação iria ocorrer.
E o Fideles se divertia com as broncas do Faxa...
Um bom tempo depois ouviu-se um som de carro e apareceram fachos de luzes provenientes de lanternas. Um velho fusquinha dos anos 60 dirigido pelo Ulisses apareceu para socorrê-los.
A alegria foi muito grande mas logo surgiu outro problema. O terreno que era um pouco inclinado tinha se transformado num imenso lamaçal e o jeito foi empurrar o carro.
O fusquinha rodava um pouco e atolava, rodava e atolava. E foram alguns quilômetros assim ...
O Jorginho e o Bacco, acompanhados dos bombeiros voltaram novamente para o mato para efetuar o resgate mas quando depois de muito esforço conseguiram chegar ao local onde tinham deixado seus companheiros não encontraram mais ninguém pois a essa altura o Ulisses já tinha pegado o pessoal.
E o fusquinha, empurrado quase o tempo todo, conseguiu chegar até um posto de gasolina situado às margens da Rodovia Castello Branco.
Já era perto de meia-noite !
Acordaram o único funcionário do posto que usando a mangueira do lava-jato deu um banho no fusca e principalmente no Max e Fideles que estavam totalmente cobertos de lama.
Menos o Faxa que só queria saber onde achar fósforos !
Foi realmente um dia inesquecível... Pelo menos para cinco pára-quedistas brasileiros !
Por Fideles , Jorginho e Faxa